terça-feira, 29 de março de 2011

Sem rodeios às amizades

Ao longo dos últimos anos fui tendo oportunidade de me cruzar com muitas pessoas totalmente diferentes entre si. A par da riqueza que me traz esta interacção com diferentes crenças e estilos de vida, não pude deixar de reparar numa constante relacionada com o tipos de relações que muitas escolhem como "ideais".
Hoje em dia, muita gente escolhe ter relações interpessoais em que há alguma intimidade mas nas quais não querem que exista uma dependência de nenhuma das partes. Quantas pessoas não ouvi já dizer que não conseguem estar numa relação em que o outro dependa delas, não conseguem estar com alguém que mande "mensagens a mais". Não estou a falar da independencia saudável que deve sempre existir; estou sim a falar daqueles casos em que se cria uma relação mais distanciada do que o normal. Qual é o limite? Qual é o "nível" de dependência procurado? Não sei. Já para não falar que cada caso é um caso. Mas onde quero chegar é o seguinte: parece-me que hoje as pessoas têm medo de se comprometerem a sério, medo de levar mais fundo as suas relações com as outras pessoas. São cada vez mais raras as amizades profundas e fundadas numa confiança verdadeira. Pergunto-me que amigos e amigas tenho eu que tenham "paciência" para ouvir os meus dramas quando preciso e , mais que isso: que perguntem por esses dramas, que perguntem por mim. Graças a Deus, sei bem quem são estas amizades e agradeço cada uma delas - Sou a última pessoa que se pode queixar de falta de possibilidades de conversas a sério.

Mas onde quero chegar é: gostava agarrar pelos ombros algumas pessoas - essas mais "desprendidas" nas relações - e dizer cara-a-cara: ACREDITA! Hoje instaurou-se um medo de entrega, um medo da possibilidade de sair mal de uma relação. Parece que a sociedade se transformou numa espécie de Ricardo  Reis:
«Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.»
Bem, newsflash: quem não arrisca não petisca. Bem sei o quão trabalhoso pode ser cuidar de uma relação (por favor, releiam O Principezinho!) mas, depois disso, oh... sabe TÃO bem telefonar a alguem e dizer: "Preciso de ti, tens tempo?" e contar tudo sem ter que explicar 50 histórias antes (para que o outro acompanhe), poder rir e chorar sem que alguem do outro lado esteja impaciente.
Mas vai para além disso. Tenho sentido, em conversas que vou tendo, que há cada vez mais pessoas que estão profundamente necessitadas de alguém que se preocupe a sério. E a preocupação vai para além do ouvir: muita gente precisa de alguém que saiba dar um empurrãozinho, um conselho, uma ajuda, qualquer coisa. Mas pelo caminho foram criando e desenvolvendo amizades com essa lacuna gigante - falta a atenção e precupação sinceras de que todos precisamos.

Sem me querer tornar melodramática, digo mesmo: hoje sou o que me fui tornando com os meus amigos. "Diz-me com quem andas, dir-te-hei quem és" e isso não tem a ver com o vestirmo-nos todos de góticos ou andarmos todos de bicicleta (exemplo parvo...). Não tem a ver com as crenças, hábitos, nacionalidades. É isso mesmo, já sabem o que vou dizer: tem a ver com aquele bocadinho de nós que entregamos a alguém. E a amizade é tanto maior quanto esse bocadinho.

No outro dia o JV repetia mais uma vez a frase de Saint-Exupéry: "Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho, mas não vai só, nem nos deixa sós; leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo." E, ainda que isso seja verdade, meus amigos: NÃO CHEGA! Se chegam ao fim do dia com a sensação de que o que precisam é de alguém que vos compreenda, então não chega! Arrisco a dizer que hoje cada vez mais criamos protecções porque estamos a crescer em egoísmo: enchemo-nos de nós e temos medo de nos perder. E esse perder, para nós, é o mesmo que dar-nos aos outros. Neste tempo em que vivemos, deixamos cada vez menos de nós mesmos a quem passa por nós. Apendemos a guardar-nos do mundo e a criar esta camada protectora que muito, muito dificilmente mostramos. Talvez como protecção da perda de privacidade que os Facebook's e etc. nos trazem, certo. Mas assustei-me ao perceber que vivo rodeada de pessoas profundamente necessitadas de conversas a sério, profundas e sinceras. Fui para fora de Lisboa fazer Missões, mas desta vez percebo que a nossa missão é aqui, entre os nossos amigos. Aprofundar amizades, entregar-nos.

Sem me querer esticar mais, digo apenas:
Dedicação. Compromisso. Entrega.
Missão.

quinta-feira, 24 de março de 2011

(no meio de apontamentos de Ética)

"A Ética decorre sempre da metafísica. Não torna ninguém bom: apenas dá hipótese à pessoa para parar e pensar nos motivos pelos quais agimos. O modo de vermos a ética deriva da maneira como encaramos a vida e a morte. A morte é o obstáculo maior e mais certo. Mas há que pensar na morte: é graças a ela que temos de escolher. Acreditarmos ou não na vida após a morte vai condicionar a maneira de viver, temos uma maneira diferente de encarar a vida porque o horizonte humano é sempre a morte."